Asti – O Espumante Italiano

Encravada entre duas colinas noroeste do Piemonte, a apenas 40 minutos de Turim e a uma hora de Milão, encontra-se a simpática e histórica cidade de Asti, famosa pela sua história, por sua culinária, pelo Palio de Asti e, principalmente, por seu Asti Spumante.

Se a corrida de cavalos, montados sem sela, faz parte da tradição da cidade desde o século XIII, o espumante, embora bem mais recente — datando do final do Século XIX —, tornou-se o verdadeiro sinônimo da localidade.

Destaca-se que a expressão “d’Asti” aparece em nomes de vários vinhos da região, incluindo Barbera d’Asti, Dolcetto d’Asti, além do citado Asti Spumante. É forçoso reconhecer, entretanto, que, mesmo havendo outros vinhos que ostentam o nome da cidade/província, quando usado isoladamente, Asti indica como principal produto, o espumante: um vinho branco, refrescante, levemente doce e elaborado com uvas Moscato.

O termo “spumante” (evidentemente traduzível para espumante, em português) é o nome genérico dos vinhos que são submetidos a uma segunda fermentação natural (o vinho já foi previamente fermentado); A segunda fermentação produz gás carbônico e confere as “bolhas” características da bebida.

No final do século XIX, o primeiro Asti Spumante foi produzido por Carlo Gancia, um enólogo que estudou a produção de espumantes na França. Gancia produziu este vinho na cidade italiana de Canelli, província de Asti, onde o vinho acabou se tornando muito popular.

Após a Segunda Guerra, o Asti Spumante cresceu em popularidade. Soldados americanos apreciaram a bebida pela sua leveza, dulçor e refrescância, e se encarregaram de disseminá-la após retornarem ao seu país. A demanda por este vinho cresceu de forma exponencial nos EUA, encorajando os produtores a recorrer a métodos de produção a granel, como o método Charmat.

O Asti DOCG é, portanto,  o segundo vinho mais exportado da Itália, perdendo apenas para o Chianti.

Espumante Asti

Uvas

A uva Moscato utilizada na produção do espumante é considerada a mais antiga variedade de uvas no mundo, sendo cultivada ao Norte da Itália há centenas (senão milhares) de anos.

Sua origem é incerta, havendo divergência se é originária da Grécia, por volta do ano 800 A.C., ou se é ainda mais antiga, tendo surgido entre o Terceiro e o Primeiro Milênio A.C. no Egito. Não obstante essa dúvida, o certo é que foi disseminada durante o Império Romano não somente por toda a Península Itálica, mas praticamente por todo o Velho Mundo.

Quando nos referimos à Moscato, entretanto, estamos nos reportando a mais de 200 tipos diferentes de uvas, tanto brancas quanto tintas, havendo ainda várias denominações, tais como: Moscatel, Muscat e Muskateller.

Os tipos mais conhecidos da uva são Muscat blanc à Petits Grains (às vezes conhecida como uva Moscato Branco), Muscat de Alexandria, Moscato Giallo, Muscat de Hamburgo e Muscat Ottonel, sendo essas duas últimas uvas tintas.

Embora encontremos tantas variedades e tão diversas denominações, há uma certa uniformidade nos vinhos produzidos a partir dessa cepa.

Apesar da origem ancestral da uva e dos vinhos produzidos a partir dela, a produção do Asti Spumante com variedades Moscato é, na verdade, relativamente recente.

Produção

A produção em larga escala do Asti Spumante, entretanto, originou uma bebida que mereceu críticas por parte dos entendedores e apreciadores de vinhos, por ser considerada uma bebida doce, de baixa qualidade e sem sabor elaborado e complexo.

Na produção dos Asti é utilizada uma variação do método Charmat. As uvas assim colhidas são desgalhadas e prensadas em tanques de aço inoxidável. O mosto obtido é filtrado, mantido sob refrigeração e estocado até o momento da produção propriamente dita, quando então é submetido à fermentação  num tanque pressurizado.  Cerca de dois terços da produção é spumante e um terço é Moscato d’Asti.

À medida que as leveduras convertem os açúcares em álcool, é produzido dióxido de carbono como subproduto, mas, ao invés de ser liberado, como ocorre na vinificação, o gás é mantido sob pressão, dissolvido no líquido, criando assim as borbulhas típicas do espumante.

Quando a concentração alcoólica atinge os níveis estabelecidos (por volta de 9%), o vinho é filtrado e esterilizado, as leveduras removidas de forma a que se interrompa o processo de fermentação.

Espumante Asti

DOC

Com vistas a elevar o padrão de qualidade e atender a paladares mais exigentes, os produtores da região investiram no aprimoramento tanto do plantio, como na elaboração dos Asti, obtendo em 1963 a Denominação de Origem Controlada DOC e nos anos 90 do século passado a categoria de DOCG.

Essa classificação significa que os Asti Spumante, pela lei italiana, devem ser elaborados quase que  inteiramente de uvas Moscato Bianco e possuírem uma graduação entre 6% e 9% de teor alcoólico .

Ademais, para buscar um distanciamento da reputação negativa que o espumante tinha, passou a se denominar apenas como Asti, numa estratégia mercadológica de renovação da marca.

Ainda no que tange à busca de mercados mais exigentes, os Asti DOCG contêm sabor menos doce e é pronunciadamente mais frutado que o produzido em anos anteriores à classificação.

Cada um dos vários vinhos produzidos na província de Asti tem  sua própria zona de viticultura, havendo alguma superposição. A zona viticultural para o vinho Asti DOCG cobre uma área nas colinas ao sul da cidade de Asti, agrupando cerca de 50 comunas das províncias de Asti, Cuneo e Alessandria. Essa área é delimitada a oeste por Serralunga d’Alba – lar de muitos Barolos – e por Acqui Terme a leste.

Nessa mesma região é produzido o “primo pobre” do Asti, mais doce e de menor teor alcoólico, o Moscato d’Asti, muitas vezes com ele erroneamente confundido.

Tal confusão, entretanto, existe apenas para os que não conhecem a categorização rigidamente imposta pela certificação de origem controlada e garantida.

Para os critérios de enquadramento como Asti DOCG há quatro classificações:

Moscato d’Asti – vinho branco levemente cintilante, doce e de baixo teor alcoólico;

Asti (Spumante) – com teor de álcool entre 6 e 11,5% vinho branco espumante;

Asti (Spumante) Método Clássico – semelhante ao Asti, mas com uma fermentação secundária em garrafa (muito parecido com champanhe é produzido no estilo méthode traditionelle) e, com um teor de álcool ligeiramente mais alto;

Vendemmia Tardiva – um vinho branco doce, mais raro, produzido a partir de uvas de colheita tardia.

O açúcar residual mínimo será de 4,5% para Moscato d’Asti. Nos espumantes pode variar de dosagem zero a 4,5%. Em se tratando de envelhecimento, os Asti Spumantes ficam 30 dias nos tanques pressurizados e o Asti Spumante Classico, mínimo de 9 meses nas borras. O Vendemmia Tardia pode permanecer de 1 ano a mais acentuando seu sabor.

Além dessas características a intensidade da gaseificação, ou melhor falando, a “quantidade de bolhas” também é diferente entre os Asti e os Moscato d’Asti. Enquanto o primeiro é considerado “spumante” apresentando um mínimo de quatro atmosferas de pressão, o segundo é um vinho “frizzante” com um mínimo de uma atmosfera de pressão.

Por força dessa diferença, Asti é embalado com garrafas grossas e resistentes e uma rolha com fio metálico como os champanhes, enquanto a pressão relativamente baixa de Moscato d’Asti requer apenas uma garrafa padrão e rolha de cortiça simples.

Até 2017, todo Asti totalmente espumante deveria ser doce, e o nível máximo de álcool era de 9,5%. A partir de 2020, foram permitidos todos os teores de doçura entre extra dry e dolce, com teor alcoólico máximo de 8,0%, removendo o limite máximo de álcool.

Terroir

O terroir onde são plantadas as uvas Moscato direcionadas para a produção do Asti são definidos pelo regulamento da autoridade que confere a denominação e origem controladas.

Nessa regulamentação são especificadas uma série de atributos a serem considerados, como: solo calcáreo, altitude mínima de 165 metros, exposição ao sol e vedação ao plantio em vales, áreas sombreadas e úmidas.

Tais terrenos são oriundos de sedimentos de antigo oceanos que banham a região no período do Mioceno e que são comuns a outras áreas produtoras de vinhos famosos, como os Borgonhas, os Barolos e os Barbarescos, assim como em regiões famosas de produção vinícola norte-americanas, como as da Califórnia e Oregon.

Dessa forma, o Asti é considerado como um “terroir-driven wine”, ou seja um vinho estreitamente vinculado à região onde é produzido.

Espumante Asti

Características

Uma das características dos vinhos oriundos da Moscato é o alto nível de açúcar residual. Ao serem produzidos apresentam pronunciado dulçor ao paladar, mesmo que alguns sejam mais secos ou neutros.

Outra marca relevante é a ausência de taninos, e com teor alcoólico próximo de 10%, o que dá leveza ao corpo dos vinhos.

Muitos dos vinhos denotam “cheiro de uva”, não muito comum em vinhos, e vão de característico intenso a delicado e frutado. Os sabores associados à Moscato podem, adicionalmente, serem associados a frutas cítricas, pêra, pêssego e flores, como de laranjeira, madressilva e rosa.

A coloração predomina o amarelo palha até o dourado. A Perlage é fina e persistente.

Harmonização

Os Asti não são vinhos de guarda e devem ser servidos bem gelados, entre 4 e 6º C. Desse modo, é uma bebida refrescante ideal para acompanhar queijos suaves, saladas frescas ou para o momento das sobremesas , principalmente se não forem muito doces, como por exemplo uma mousse de fruta.

Outra opção é servi-lo durante o dia, à beira do mar ou da piscina acompanhado de frutas brancas, como abacaxi, melão e pêra. Peixes brancos, geléia de frutas e torta de creme são sabores que combinam perfeitamente com os Asti. Há ainda a uma possibilidade mais ousada de servi-lo com comida japonesa, fazendo sua doçura e leveza contrastarem com o salgado do shoyu, com o ardor do wasabi e com o frescor do sushi e do sashimi.

Na Itália e no mundo temos percebido uma crescente tendência de pequenas propriedades produzindo seus próprios vinhos de forma artesanal e orgânica, e na região de Asti não é diferente. Esse crescimento será essencial para as novas gerações e melhorias na reputação das denominações. Salute!

Sobre Deyse RibeiroDeyse Ribeiro é natural de Minas Gerais, mas vive na Toscana desde 2007. Fez curso de sommelier na FISAR, master em Wine Expert (Academia del Gusto) e Guia Enológica na Itália. É empresária, guia de turismo, especialista em turismo de experiência na Itália, além de editora do Portal Tour na Itália, e deste site.

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