Muito se fala hoje sobre os Supertuscan, mas você conhece mesmo os chamados “super toscanos”?
O Super tuscans (você pode encontrar ainda escrito SuperTuscan ou Super tuscan) é uma “categoria” nascida da frustração com as regras tradicionais de produção de vinho da Itália. Produtores ambiciosos procuraram fazer estilos e experiências modernos fora das restrições do sistema de denominação italiano, conhecido como Denominazione d’Origine Controllata (DOC).
“Super Tuscan se tornou sinônimo de vinhos de alta qualidade da denominação IGT ( Indicazione Geografica Tipica )”, diz o enólogo Bibi Graetz, que produz vinhos com sua marca homônima fora de Florença.
A rebeldia ajudou a divulgar a super história da Toscana, enquanto a qualidade e a singularidade ajudaram a vender seus vinhos. Marcas como Sassicaia, Tignanello e Ornellaia tornaram-se queridinhas dos críticos de vinho. Os amantes do vinho durante a década de 1980 empurraram os preços para o reino dos colecionadores. Mas meio século depois, como a definição de um supertoscano evoluiu e a categoria ainda é relevante para os consumidores contemporâneos?
O que são os Supertuscan?
Super tuscan (Supertuscan ou Super tuscan) são definidos como vinhos tintos produzidos na Toscana que não respeitam, propositalmente, as regras tradicionais de preparo da região, mas utilizam outros tipos de uvas, principalmente cabernet sauvignon, além ou em substituição ao Sangiovese tradicional e, portanto, não podem ser classificados como produtos DOCG. Estes vinhos são frequentemente envelhecidos em barricas (barris de carvalho) por cerca de 12-14 meses.
História – três raizes distintas:
O termo supertuscan foi usado pela primeira vez pelo jornalista inglês e mestre do vinho Nicholas Belfrage em meados da década de 1980, e depois adotado pela imprensa americana. Certamente foi muito mais tarde do que o nascimento daquele tipo de vinho, que tem pelo menos três raízes distintas:
- O primeiro, o que mais tarde ficou mais famoso, foi determinado pelo nascimento de Sassicaia, que oficialmente viu a luz com a safra de 1968 (que segundo Tachis era um blend entre ’66, ’67, ’68 e ’69), mas que teve origens anteriores como o “vinho de família” do Marquês Incisa della Rocchetta, mas sem ter saído para o mercado. Era um tinto de Bolgheri à base de cabernet sauvignon com saldos de cabernet franc e não podia ter qualquer denominação porque na altura não estava previsto no caderno de encargos. Então, em 1994, o Bolgheri Doc foi criado e dentro dele o Bolgheri Sassicaia encontrou sua posição de autoridade, mesmo com uma dicção específica.
- A segunda origem deriva do puro Sangiovese e teve como precursor o Vigorello 1968, feito por Enzo Morganti, então diretor da vinícola San Felice, propriedade da RAS, e por Giulio Gambelli, lendário enólogo de Poggibonsi e aluno de Tancredi Biondi Santi.
- A terceira via foi a da mesclagem entre Sangiovese e Cabernet Sauvignon, feita com Tignanello degli Antinori, mas apenas a partir de 1975, porque a primeira edição, a de 70 ainda estava com a dicção Chianti Classico Riserva del Podere Tignanello, e a de ’71, ainda não previa aquele “blend” herético, e baseava-se no Sangiovese com pequenos saldos de vinhas tradicionais locais. Na versão de 70 ainda com adições mínimas de uvas brancas, na versão ’71 sem. Em muitos casos, a figura de Giacomo Tachis foi decisiva. Enólogo de extraordinária capacidade, aluno de Peynaud em Bordéus, responsável até 1993 pela parte enológica do Marchesi Antinori, foi, juntamente com Piero Antinori, o inspirador desses vinhos.
Tudo fruto de uma tradição desenvolvida, e determinada por uma necessidade experimental, mas também econômica. Em um período em que o Brunello ainda não havia explodido e o Chianti Classico vivia uma crise de imagem e vendas a ponto de aconselhar muitos produtores a “romperem” com a denominação. Por muitos anos, os supertuscans destacaram o potencial da vinificação da Toscana e contribuíram para a evolução do tradicional DOC e do DOCG, disciplinar. Hoje, por exemplo, é possível produzir Chianti Classico com Sangiovese puro, algo que não era permitido há apenas vinte anos. Um mérito indiscutível de muitos desses vinhos e seus criadores que escreveram um capítulo fundamental da viticultura italiana nas últimas décadas.
Os primeiros vinhos Supertuscan eram vinhos tintos de alta qualidade produzidos por famílias vinícolas nobres. Variam em estilo, porém a influência de Bordeaux é evidente com o uso de vinhas francesas e barris de carvalho francês novos. Os melhores Super Toscanos são encorpados, ricos em sabores, com taninos incorporados e aromas de carvalho, podendo envelhecer por décadas. O primeiro a ser conhecido foi o Sassicaia De Tenuta di San Guido, uma mistura de Cabernet Franc e Cabernet Sauvignon lançado em 1971, único a ter um DOC hoje. Outros exemplos incluem Tignanello, Ornellaia, Rondinaia e Solaia.
Uvas
Cabernet Sauvignon e Cabernet Franc foram as uvas escolhidas para o Sassicaia. Para o Tignanello, a mistura eleita foi o Sangiovese local com o Cabernet. O sucesso de Sassicaia e Tignanello inspirou muitos outros vinhos feitos ou incluindo variedades de uvas internacionais não nativas da Itália, incluindo Tenuta dell’Ornellaia, Tua Rita e Le Macchiole.
Nem todos os super toscanos são feitos de Cabernet. O Masetto de Ornellaia, o Redigaffi de Tua Rita e o Messorio de Le Macchiole, por exemplo, são 100% Merlot. A maioria deles é feita com todas ou algumas variedades de uvas não autóctones, mas “supertoscano” não é uma classificação legalmente definida no que diz respeito aos regulamentos do vinho.
O termo era usado para qualquer vinho que não atendia aos padrões DOC – no Chianti Classico, isso significava aqueles que não se misturavam com uvas brancas, ou que usavam 100% Sangiovese, ou que seguiam diferentes padrões de vinificação e envelhecimento. Hoje, a maioria dos supertoscanos usa a designação IGT (Indicazione Geografica Tipica) ou o Bolgheri DOC (mas somente produzidos em Bolgheri), que foi estabelecido para vinhos tintos usando variedades de uvas internacionais em 1994. Os vinhos tendem a ser modernos, grandes e ricos – e muitas vezes têm um preço muito alto, mais de 100 euros, ou mais por garrafa, o Masseto por exemplo, pode sair da vinícola já custando mais de 500 euros. Existem supertoscanos brancos ainda novos no mercado. Ornellaia estreou um Toscano Bianco feito de Sauvignon Blanc e Viognier.
IGT – Indicazione Geografica Tipica
As DOCs não apenas restringiam o uso de variedades não nativas, mas também prescreviam receita para alguns vinhos. O uso de 100% Sangiovese foi proibido para o Chianti Classico, já que era prejudicial à qualidade do vinho e a mistura teve que incluir certas variedades de qualidade inferior, incluindo pelo menos 10 % variedades brancas.
A IGT foi introduzida em 1992, para permitir um certo nível de liberdade aos viticultores da Itália. Influenciados por produtores de Chianti preocupados com a qualidade à medida que esses vinhos de dentro e fora do Chianti atingiam níveis bem acima de seu humilde status de Vino da Tavola. Um dos primeiros foi Antinori, cujo Tignanello de 1971 era uma mistura de Sangiovese e Cabernet Sauvignon da zona Clássica.
A classificação Indicazione Geografica Tipica – IGT, está acima do Vino da Tavola, mas abaixo dos vinhos DOC ou DOCG. Os vinhos IGT foram autorizados a usar uvas como Cabernet Sauvignon, Franc, Merlot e Syrah, que foram proibidas nas denominações mais restritas. Dois anos depois, Bolgheri DOC mudou suas regras para permitir certas variedades internacionais, um movimento que finalmente integrou os vinhos Supertoscanos no sistema DOC.
A IGT se baseia na região de origem, ao invés dos estilos de vinhos e das variedades de uvas. Desde 2010, a classificação IGT foi incluída na categoria IGP da Comunidade Européia (assim como o DOCG e o DOC no PDO). Esta categoria inclui vinhos produzidos em determinadas regiões ou áreas geográficas (autorizadas por lei), de acordo com uma especificação de produção; podem mostrar no rótulo, para além da indicação da cor, também a indicação da casta utilizada e do ano da vindima. Devem ser feitos com pelo menos 85% da variedade de uva declarada.
Hoje em dia, os Supertoscanos podem ter “status” (não quer dizer que são) IGT, DOC ou DOCG. Por exemplo:
- Sassicaia tem sua própria sub-denominação, Bolgheri Sassicaia DOC
- as leis de Chianti mudaram em um esforço para atrair os três Super Tuscans da zona Clássico – Tignanello, Cepparello e Flaccianello. Embora estes três vinhos possam ser rotulados como Chianti Classico DOCG, eles permanecem sob a classificação IGT.
Produção
A reação a Sassicaia e Tignanello teve um impacto profundo na vinificação da da região e, durante a década seguinte, várias vinícolas da Toscana começaram a fazer experiências com seus próprios Super Tuscans. Em termos gerais, isso significava incorporar variedades de Bordeaux, especialmente Cabernet Sauvignon, e usar pouca ou nenhuma uva branca, para cuvées de cor profunda com caráter esfumaçado e de casca grossa.
Esses vinhos foram seguidos por ícones como Antinori Solaia, um blend mais “pesado” de Cabernet lançado em 1978, e Tenuta Dell’Ornelaia em 1985. Seu sucesso provou de várias maneiras que a noção de terroir era fluida, que as encostas da Toscana não eram restritas a Sangiovese e poderia de fato render Cabernet tão nobre e sofisticada quanto o do Medoc.
Com a Cabernet tendo sido apresentada de forma convincente, o Merlot veio em seguida em 1986 na forma de Massetto, um Merlot 100% específico do local e de vinhedo único da Tenuta Dell’Ornellaia. Se a inspiração de Sassicaia e Solaia veio de Lafite ou Latour, Masetto poderia ser visto como uma visão ousada do próprio Pétrus de Bolgheri, um vinho suntuoso e sedoso de concentração e sutileza inimitáveis e o alto preço exigido.
Terroir
Não há um único terroir, porque praticamente hoje, em quase toda toscana as vinícolas escolhem produzir e denominar um seu vinho como “supertuscan”, portanto é difícil descreve-lo.
Escolho aqui então citar os vinhedos da zona de Bolgheri, mais conhecida de produção do Supertuscan. Eles estão localizados em uma área com bosque e oliveiras com terras planas e suaves colinas. Possui 1/5 de montanhas e 2/3 de colinas O solo básico é de marla arenosa-calcária, com mistura de argila e minerais que impactam diretamente na viticultura.
O clima nas colinas apresenta verões bem quentes e secos, outonos com risco de chuvas durante a colheita. Na costa é quente e seco, o que garante safras mais tranquilas.
Alguns anos depois, foi descoberto um talhão de solo argiloso no interior da propriedade Tenuta dell’Ornellaia. Isso levou ao plantio do Merlot à imagem da Pomerol, e à criação da marca monovarietal Masetto. Produzidas em diferentes vinícolas, alcançaram um sucesso duradouro graças em parte aos seus perfis amplos e musculosos. Eles foram uma revelação em sua estreia, já que para alguns, Chianti era frequentemente considerado um vinho pouco robusto, azedo e sem graça.
Características
Os Super toscanos são vinhos finos tintos obtidos através de uvas de corte “bordolese“, como se diz por aqui, e uvas autóctones de Toscana, com passagem por barris de carvalho francês. Estes vinhos, portanto, diferem em termos de variedade de uva ou métodos de vinificação e envelhecimento dos vinhos que se enquadram no DOCG Chianti e Chianti Classico. A comparação entre os adeptos dos DOCGs e os dos vinhos Supertoscanos é muito acalorada e assenta em argumentos distintos: por um lado a história e a tradição, por outro o gosto pela novidade. Dependem do ano das vinhas, do envelhecimento e do tipo de vinificação.
Hoje, durante os tours eu costumo dizer que na prática, funciona assim:
Quando uma vinícola na Toscana hoje, faz um vinho que julga importante, autoral, fora das denominações rigorosas das DOC e DOCG, ela o apresenta como Supertuscan.
O termo ‘Super Tuscan’ foi usado para descrever alguns dos melhores vinhos tintos da Toscana, como Tignanello, Sassicaia, Ornellaia, Solaia e Masetto.
Os vinhos Ornellaia têm um típico corte bordalês que varia entre Cabernet Sauvignon, merlot, cabernet Franc e Petit Verdot. Costuma apresentar cor rubi intenso e profundo, tons violáceos, tem aromas de boa intensidade, com notas de chocolate em meio à frutas vermelhas e escuras, como ameixas, um leve sabor tostado com especiarias se apresenta ao final. Taninos presentes deixam o vinho seco porém macio, bom corpo, boa acidez,. Em boca percebe-se um gosto herbáceo e notas de alcaçuz, com ótima persistência.
O Tignanello pode ser composto de Sangiovese, Cabernet Sauvignon e de Cabernet Franc em barricas de carvalho francesas. Um vinho com boa intensidade e complexidade aromáticas. Aromas de geléias de frutas silvestres, ameixas pretas, café torrado e especiarias. Algo de terroso e herbáceo juntamente com couro se abrem ao fundo. De tonalidade Rubi muito denso, fechado que não se abre à luz, porém brilhante. Seco com acidez perfeita, álcool equilibrado. Bom corpo com taninos presentes e macios com muita persistência.
O Solaia, pode ser produzido com Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc e Sangiovese. É um vinho bem elegante e potente. Com tonalidade Vermelho-rubi com reflexos púrpura. O aroma é intenso e marcante, com notas que vão de frutas vermelhas maduras com toques de baunilha e tostado, cheio de especiarias que compõem um bouquet de grande persistência.
O Massetto é um supertoscano produzido com 100% de uvas Merlot. Elegante e harmonioso, é rico em taninos finos e frescor. Notas de frutas vermelhas e nuances balsâmicas e picantes. De tonalidade vermelho rubi concentrado. Tem final longo e notas marcantes de cacau.
E o nobre Sassicaia produzido com Cabernet franc e Sauvignon na região de Bolgheri com diferencial no sabor mais mineral e frutado para citar os maiores exemplos.
A verdade é que os produtores estão encontrando seus estilos e não obedecem a um quesito apenas. Há Supertoscanos feitos inteiramente de Sangiovese.
Harmonização
Os Supertoscanos costumam ter o teor alcoólico acima de 13,5% o que naturalmente, pede pratos mais fortes não muito gordurosos. Combinam bem com carnes assadas, churrasco de fraldinha ou maminha, massas com muito molho de tomate e cogumelos. Os queijos devem ser mais curados e com uma certa picância.
A variedade e diversidade dos vinhos IGT continuam a se expandir e evoluir no início do século XXI. A categoria libertou os produtores de vinho italiano das restrições tradicionais e permitiu a produção de vinhos para o paladar moderno e para os mercados de exportação globais.
Vinhos como Sassicaia, Tignanello e Ornellaia chamaram a atenção do mercado internacional de vinhos para a Itália. Vinhos ousados, grandes e ricos que ganharam pontos de crítica, os Super Tuscans indiscutivelmente mudaram a maré para o país, ganhando elogios e provando que os vinhos da Itália podiam competir no cenário mundial.
Hoje, críticos e consumidores estão olhando além desses nomes icônicos para explorar o extraordinário patrimônio vitícola da Itália, com os estilos baseados no terroir de Barolo, Barbaresco, Montalcino, Etna e outros começando a encontrar os holofotes. Embora haja muito mais competição, os Super Tuscans continuam sendo alguns dos vinhos mais finos e colecionáveis do país.
Leia também:
– Brunello di Montalcino
– Bolgheri; A casa do Sassicaia
– Chianti; Uma história com gosto
– Vinho italiano: um prazer e um investimento