Se há um vinho tinto que você não conhece, mas deveria, é a garrafa mais nobre da Toscana, Vino Nobile di Montepulciano. E atenção, atenção, não deve ser confundido com Montepulciano d’Abruzzo!

Introdução

O passado glorioso e a importância entre o território de Montepulciano, a sua história e o Vino Nobile são os elementos essenciais para garantir, no presente e no futuro, qualidade e autenticidade a tudo o que vem desta “Terra Nobre”. O Vino Nobile di Montepulciano é uma das três grandes áreas que expressam a elegância da uva Sangiovese, na Toscana, assim como os icônicos Chianti e Brunello.

O Nobile é feito com uvas cultivadas em torno da cidade de Montepulciano, no sul da Toscana. A cidade medieval está situada em uma colina na província de Siena, numa área colinosa chamada Val D’Orcia, no vale do Rio Orcia.

A história da viticultura

A viticultura aqui remonta muitos séculos aos tempos etruscos. Tito Lívio, em seus contos, já falava que os gauleses vieram para a Itália atraídos pelo vinho daquelas colinas que um etrusco de Chiusi lhes provou para convencê-los a cruzar os Alpes. Em documento datado de 789, citado por Emanuelle Repetti em “Dizionario Geografico Fisico Storico della Toscana“, o clérigo Arnipert oferece à Igreja de San Silvestro em Lanciniano, terras agrícolas e um vinhedo localizado no Castello di Policiano; outro documento de 1350, fixa as condições de comercialização e de exportação de um vinho produzido na zona de Montepulciano.

Durante o século XV, o vinho local era um dos favoritos da aristocracia de Siena e, no século XVI, era reverenciado pelo Papa Paulo III, que falava das excelentes qualidades do vinho. Em 1685, o Vino Nobile di Montepulciano também é citado pelo poeta Francesco Redi, que, além de elogiar a obra de “Baco na Toscana” – Montepulciano é o rei de todos os vinhos! – escreveu uma ode ao conde Federico Veterani dedicada exclusivamente ao louvor das qualidades deste vinho.

O seu esplendor se deu na época do Renascimento, no século XVI, sob o poder da família Médici, quando passou por um processo de renovação urbana, confirmando sua importância. O favorito entre os influentes reis, papas e presidentes italianos, o vinho foi celebrado ao longo da história como o vinho dos nobres. Thomas Jefferson, Presidente americano e um dos arquitetos da Declaração da Independência, era um apaixonado colecionador de vinhos. O estadista comprava 123 garrafas por ano de Nobile, certificando-se de que vinham de Montepulciano e eram produzidas com Sangiovese, até o pedido recorde de 473 garrafas feito em 1806.

Território

O Vino Nobile di Montepulciano nasce nas colinas entre o Val D’Orcia e o Val di Chiana, em vinhedos situados em uma bela paisagem adornada com monumentos, vilas e casas de campo. Até algum tempo atrás, o vinho Nobile de Montepulciano havia sido relegado a segundo plano pela ascensão dos renomados Brunello, os Supertuscan e os Chianti. Nas últimas décadas, através da modernização dos equipamentos, das técnicas das vinícolas e a renovação das vinhas foi possível confirmar a qualidade do Vino Nobile.

A área de produção compreende as colinas entre 250 e 600 metros acima do nível do mar no município de Montepulciano, na província de Siena.

Os vinhedos ficam em duas zonas separadas pela planície do Val di Chiana, em altitudes de 250 a 600 metros, e a média pluvial anual é de aproximadamente 740 mm.

Produção

A onda de inovação do vinho que se alastrou pela Toscana nas últimas duas décadas trouxe resultados positivos para Montepulciano, com menor produção e maior cuidado. Os vinhos são armazenados em barris de madeira seguindo o costume tradicional e o rendimento máximo para Vino Nobile di Montepulciano é de 56 hl / ha.

Importante recordar que no mesmo território, além do Vino Nobile di Montalcino DOCG, há ainda a produção de outros vinhos que fazem parte do mesmo consórcio de produtores:

  • Vino Nobile di Montepulciano DOCG
  • Vino Nobile di Montepulciano DOCG Riserva
  • Rosso di Montepulciano DOC
  • Vin Santo di Montepulciano DOC

Uvas

A base do Nobile é a uva Sangiovese, pertencente principalmente ao biótipo conhecido como Prugnolo gentile. A Prugnolo Gentile tem menor acidez que os Chiantis Classicos e taninos mais suaves que  os Brunellos.

Não deve ser confundido com o Montepulciano D’Abruzzo que é feito com a uva Montepulciano (nesta caso a uva chama Montepulciano e não a cidade de produção) na região de Abruzzo.

Ao contrário de Brunello di Montalcino, o vinho de Montepulciano é feito de uma mistura de uvas. Nas versões normal e Riserva (Reserva), é produzida através de um blend de pelo menos 70% de uvas Sangiovese, pertencentes principalmente ao biótipo conhecido como Prugnolo gentile, e no máx. 30% de variedades de uvas pretas e brancas (máx. 5%), excluindo variedades de uvas aromáticas, com exceção de Malvasia Bianca Lunga e autorizadas para cultivo na região da Toscana. Fica à critério do enólogo definir se produz um vinho com 100% da referida casta (há um mínimo e não um máximo), ou se opta por um blend, sempre respeitando a porcentagem mínima, assemelhando-se sua composição do Chianti.

Entre as vinhas complementares, foram identificadas ao longo do tempo várias castas de uva preta, tanto autóctones (Canaiolo nero, Mammolo) como internacionais, capazes de aumentar o potencial do território e da videira de base.

Regulamentação  DOCG

O Vino Nobile é um dos vinhos tintos mais famosos da Toscana. Embora muitas vezes caia nas sombras dos vizinhos Chiantis, Brunello ou Super Tuscans,  Nobile foi o primeiro vinho DOCG a aparecer no mercado italiano.

Em julho de 1966, foi emitido o Decreto que reconheceu a Denominazione di Origine Controllata – DOC “Vino Nobile di Montepulciano”, mas o reconhecimento maior veio com a aprovação da Denominazione di Origine Controllata e Garantita – DOCG, em 1980.

Para receber o selo DOCG, o tinto deve ser produzido na área da comuna de Montepulciano, excluindo a região de Valdichiana, em vinhedos entre 250 e 600 metros acima do nível do mar, com produção máxima de 8 toneladas por hectare. Tanto a vinificação quanto o período de envelhecimento têm que ocorrer nos limites de Montepulciano e, sem dúvida, os melhores tendem a ser aqueles que estagiam por períodos de 5 a 10 anos em adega.

Para que um Vino Nobile di Montepulcuano seja cons

iderado como tal, é preciso seguir algumas regras ditadas pelo Diciplinare (veja aqui):

UVAS – O Vino Nobile di Montepulciano só pode ser obtido a partir de uvas cultivadas na área de produção prevista no caderno de encargos, utilizando as seguintes vinhas:

    • Sangiovese, chamado em Montepulciano Prugnolo gentile: mínimo 70%
    • Outras vinhas, adequadas para o cultivo na região da Toscana, também podem contribuir com um máximo de 30%, desde que as variedades de uvas brancas não ultrapassem 5%. As variedades de uvas aromáticas estão excluídas, com exceção da Malvasia Bianca Lunga.

ENVELHECIMENTO: O Vino Nobile di Montepulciano deve ser submetido a um período de maturação de pelo menos dois anos, a partir de 1 de janeiro do ano seguinte à colheita. Essa maturação pode ocorrer, a critério do produtor:

  • por 24 meses em madeira (barril)
  • por pelo menos 18 meses em madeira mais os meses restantes em outro recipiente
  • por 12 meses no mínimo em madeira mais 6 meses no mínimo em garrafa mais os meses restantes em outro recipiente
    Nestes dois últimos casos, o início do envelhecimento em madeira não pode ser prolongado para além do dia 30 de abril do ano seguinte à colheita.

VENDA: O Vino Nobile di Montepulciano não pode ser colocado no consumo antes de decorridos os dois anos de maturação obrigatória calculados a partir de 1 de janeiro do ano seguinte ao da produção das uvas. Também para o tipo reserva, o período de maturação é calculado a partir de 1 de janeiro do ano seguinte ao da produção da uva.

ALCOOL: O Vino Nobile di Montepulciano proveniente de uvas com título alcoométrico natural mínimo de 12,50% e submetido a um período de maturação de pelo menos 3 anos, dos quais 6 meses de estágio em garrafa, pode ter a reserva de qualificação no rótulo, sem prejuízo aos períodos mínimos de uso de madeira indicados acima. Para fins de melhoria, é permitida a adição de um máximo de 15% de diferentes safras de Vino Nobile di Montepulciano. O título alcoométrico total mínimo é de 12,50% para o tipo normal e de 13,00% para o tipo reserva.

Todos os vinhos devem ser engarrafados no município de Montepulciano e deve ter um mínimo de extrato seco de 23 g / l.

Terroir

Os solos são geralmente mais arenosos e mais aluviais, permitindo o amadurecimento precoce das uvas. Diferente do restante da região, sem a coluna de calcário de outros terrenos no topo da Toscana, os vinhos tendem a ser de médio a encorpado, com taninos firmes e acidez viva.

Combinando a riqueza do Brunello com o perfume do Chianti, o Vino Nobile di Montepulciano não é apenas um dos vinhos mais antigos da Toscana, mas também o que mais perdeu e hoje luta com todas as suas forças para reconquistar sua coroa. Com um pouco mais de paciência e tempo de garrafa, ele  mostra todo o seu potencial.

em uma visita a uma vinícola em Montepulciano

Características

Um vinho elaborado a partir desta casta, quando bem feito, pode ser uma das melhores experiências que você vai ter.

O Vino Nobile di Montepulciano DOCG tem uma cor vermelho rubi intensa e brilhante, característica dos vinhos Sangiovese na juventude, devido ao longo requinte a que muitas vezes é submetido o Nobile di Montepulciano tende a assumir uma tonalidade granada intensa e em alguns casos nuances alaranjadas evidentes. A consistência é geralmente boa, condizente com vinhos de grande complexidade e estrutura.

O  Nobile  tem um perfil olfativo bastante complexo e interessante. Esta qualidade é ainda reforçada pelos longos tempos de maturação previstos pela disciplina de produção e que conferem ao vinho aromas terciários característicos. Apesar disso, as notas mais típicas do Sangiovese, pertencentes ao mundo das flores e frutas, também são percebidas no Vino Nobile di Montepulciano. Ameixa e cereja preta são as principais notas frutadas evidentes na abertura, muitas vezes seguidas de mirtilo, framboesa e amora. Há também sensações florais como o violeta e às vezes até rosa. As notas de especiarias terciárias presentes no Vino Nobile di Montepulciano abrangem baunilha, canela, alcaçuz, noz-moscada, tabaco, pimenta preta e pimenta rosa, acompanhadas por sensações balsâmicas de mentol e eucalipto. Os tradicionais taninos do Sangiovese e a sempre bem-vinda nota de frescor resídua, é suavizado pelo envelhecimento e pela estrutura decididamente plena deste vinho.

Na boca é muito estruturado, equilibrado e elegante, com uma tanicidade bastante marcada que contribui para a boa longevidade do vinho.

É aconselhável abrir a garrafa pelo menos de meia hora a uma hora antes da degustação, até várias horas no caso de um Vino Nobile di Montepulciano com um envelhecimento mais longo ou que tenha passado um longo período na cave. Use uma taça de tamanho médio-grande, balão ou luz larga para permitir a difusão dos aromas. Temperatura de degustação, 18-20 ° C dependendo do tipo provado.

Na maioria das vezes, produz vinhos tintos de corpo médio, com estrutura tânica que vai da média à forte, o que o torna um vinho particularmente persistente e  digno de nota. Os melhores exemplos devem ter idade de 8-15 anos, enquanto Reservas podem durar mais de duas décadas

Harmonização

Nobile é muito versátil; pode ser apreciado sozinho, compartilhado com amigos, mas sempre acompanhado com comida. A Sangiovese (Prugnolo Gentile) gosta de pratos com toque de acidez e boa dose de gordura.

Experimente harmonizar com pizzas, massas à base de molho de tomate, ragu com polenta, carré de cordeiro, carne de cabrito e risotos com linguiça.

Massa larga com ovos ao ragu de javali e azeitonas pretas secas. Prove as iguarias como Piccione al Lardo, pombo assado envolto em toucinho aromatizado com alecrim e Fiorentina con Fagioli all’uccelletto, bisteca bovina maturada com osso assada mal passada, servida com feijão branco em molho de tomates maduros e sálvia.

Com o Nobile, não há necessidade de escolher entre agora ou depois – você pode aproveitar hoje, amanhã… O Vino  Nobile combina com tudo.

Dicas:

Visitem a Enoliteca. A Enoliteca é um atrativo para visitantes, pois reúne café e winebar que disponibiliza vinhos de todas as vinícolas membros do Consórcio, deixando os visitantes apaixonados e sedentos por conhecer mais detalhadamente o Vino Nobile di Montepulciano e sua história.

Strada del Vino: A Strada del Vino Nobile di Montepulciano e os Sabores da Valdichiana Senese é a Associação que desde 1998 se empenha em valorizar e promover a beleza e a variedade da Valdichiana Senese, território do sul da Toscana. Os membros da “Strada” são produtores de Vino Nobile di Montepulciano e de excelências gastronómicas locais, restaurateurs e enólogos, profissionais do sector da hotelaria e spa, associações e entidades activas na área, incluindo os Municípios de Cetona, Chianciano Terme, Chiusi, Montepulciano, San Casciano dei Bagni, Sarteano, Sinalunga, Torrita di Siena, Trequanda e a União dos Municípios de Valdichiana Senese. O compromisso da “Estrada” é difundir da forma mais autêntica o conhecimento do património eno-gastronómico, paisagístico, histórico-artístico e termal da Valdichiana Senese através de múltiplas atividades.

Eventos:

Leia também:
– Brunello di Montalcino
– Bolgheri; A casa do Sassicaia
– Chianti; Uma história com gosto
– Vinho italiano: um prazer e um investimento

Sobre Deyse RibeiroDeyse Ribeiro é natural de Minas Gerais, mas vive na Toscana desde 2007. Fez curso de sommelier na FISAR, master em Wine Expert (Academia del Gusto) e Guia Enológica na Itália. É empresária, guia de turismo, especialista em turismo de experiência na Itália, além de editora do Portal Tour na Itália, e deste site.

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